Espaço inaugurado neste ano no CT Dr. Joaquim Grava foca em atenção, reação, visão periférica e tomada de decisão para aprimorar desempenho dentro de campo
Tela interativa com diversas atividades na sala de treinamento cognitivo do Corinthians no CT Dr. Joaquim Grava — Foto: Rodrigo Coca/Agência Corinthians
No CT Dr. Joaquim Grava, o Corinthians incorporou à rotina dos atletas uma sala de treino inovadora, equipada com luzes interativas, telas sensíveis ao toque, óculos de realidade virtual e atividades guiadas por tecnologia. A proposta é clara: desenvolver a mente como se treina o corpo.
— Hoje se encara a parte mental não somente como cuidado da saúde. Alta performance não tem nada de saúde mental. O que se exige é performance mental — explica o preparador mental Lulinha Tavares, contratado em janeiro e responsável pelo espaço inaugurado em maio, ao lado da academia.
Segundo Lulinha, performance mental envolve dois pilares: o autoconhecimento e o controle emocional do atleta, incluindo ansiedade, respiração e frequência cardíaca, além do treino de atenção, reação, visão periférica e controle de impulsividade, fundamentais para decisões rápidas durante os jogos.
Com o futebol cada vez mais competitivo, cada detalhe conta. Por isso, o treino cognitivo complementa a rotina física e científica dos atletas. Antes das atividades em campo, todos passam por avaliação da equipe de fisioterapia e ativação na academia. Uma parte do elenco frequenta a sala cognitiva, com adesão voluntária baseada na percepção de benefícios.
Entre os mais engajados estão o atacante Gui Negão, que inicialmente tinha receio de participar, Yuri Alberto, os zagueiros André Ramalho e Cacá, e o goleiro Felipe Longo. Cerca de dez jogadores utilizam o espaço diariamente.
— Antes eu tinha medo de ir lá. O pessoal que fazia era mais experiente e eu tinha receio de ir e fazer errado. Mas hoje eu acho muito importante para os treinos e os jogos, ajuda na concentração, na atenção e na tomada de decisões — conta Gui Negão.
O exercício favorito de Gui envolve óculos que bloqueiam parcialmente a visão e requer leitura de letras em um quadro enquanto toca a bola com a perna indicada. Segundo Lulinha, o cérebro “completa” a parte da imagem vedada, estimulando o desenvolvimento neural.
— Hoje se sabe que, por neuroplasticidade, você consegue capacitar o neurônio, para a velocidade de reação do atleta ser muito mais rápida. O que isso dá nele? Confiança e autocontrole. É criada uma dificuldade, e esse atleta encontra soluções — detalha o coach mental.
Gui Negão lidera o ranking do exercício “toque rápido”, em que precisa tocar o mais rápido possível nos círculos que surgem na tela em 60 segundos. Ele acumula 114 pontos, equivalente a 526 milissegundos de reação por toque.
Outro exercício popular é o “trilhas de números”, que trabalha raciocínio e atenção ao ordenar os círculos do menor para o maior. O goleiro Felipe Longo é destaque nesta atividade.
— O seu cérebro é treinável. O cérebro não discerne o que é real e o que é imaginário. O cérebro fica treinado, assim como a musculatura fica treinada. Com isso, a tomada de decisão fica muito melhor — reforça Lulinha.
— Eu estou melhorando bastante meu foco, porque a gente está fazendo bastante coisa bem positivas com o Lulinha — comenta Yuri Alberto.
— Tem sido muito positivo para nós isso. Eu já tenho hiperfoco dentro do jogo, mas, para alguns que não têm, poder treinar controle de impulsividade, agilidade e reação, tem sido muito positivo para nós. Todos os dias, grande parte do grupo tenta passar ali para fazer algumas coisas para poder estar com a cabeça mais ativa para a hora do treino — completa o atacante.
Além do CT, Lulinha acompanha o elenco em jogos e leva exercícios cognitivos para o vestiário antes das partidas.
— Basta você imaginar que o atleta passa 40 ou 45 minutos aquecendo o corpo. E, muitas das vezes, erra o primeiro passe. É necessário que ele também treine o seu cérebro, o seu olho, a sua mente, para adequar os seus níveis neurológico, visual e de concentração — explica o preparador.
O executivo Fabinho Soldado vê o projeto como um passo natural na evolução do treino de atletas de alto rendimento, tornando o Corinthians pioneiro no país:
— Comprovadamente o futebol de alto rendimento é de detalhes, e esse departamento vem para ajudar para que os atletas possam, com o treinamento mental, terem foco maior a cada jogo. E que o clube consiga, ao final, ter um atleta melhor preparado para ajudar o Corinthians em busca de seus objetivos.
Os resultados já são perceptíveis e, a partir do próximo ano, o clube planeja implementar testes cognitivos regulares no início da temporada, assim como exames médicos e avaliações físicas, permitindo acompanhar o progresso individual dos jogadores.
— Cada vez mais os profissionais do esporte têm trazido a neurociência como ponto diferencial para o dia a dia de trabalho. A próxima evolução do esporte é a evolução neurocientífica. É explorar mais a capacidade cognitiva, porque o corpo já está chegando ao limite… Chegou a era do cérebro — avalia
Victor Cavallari, psicólogo do esporte e fundador da Sensorial, empresa fornecedora dos equipamentos do Corinthians.
✦ Fonte – Jogo de Hoje 360°

